" À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo."

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Parte I

Sentada num banco de jardim, ela espera pela chave. Não, não a procura. O que ela quer mesmo é que a encontrem para que possa voltar a sorrir. Tem um sorriso tão lindo. Todos anseiam voltar a ver um brilhozinho naqueles profundos olhos castanhos e uma expressão de alegria naqueles lábios encarnados. Enquanto espera (e desespera), pensa na vida. Pensa em como está rodeada de felicidade e só ela não a encontra. Pensa em todas as suas acções na tentativa de descobrir algum defeito. Mas nada. Que mal poderá ela ter feito para que ninguém apareça com a chave? "Maldita chave", diz para si mesma. " Porque é que não deixas que te encontrem? porque é que continuas escondida?".
Ainda sentada no banco de jardim, enrola uma ponta do cabelo. Ela sabe que mais tarde ou mais cedo, algo irá acontecer. Só que a impaciência já começa a fazer das suas. Rói umas quantas unhas, sempre a olhar para o relógio. O tempo continua a passar muito calmamente, tornando a espera mais longa. Uma eternidade. Ao deixar de ter unhas para roer, começa a observar o que a rodeia. Folhas levantam com o vento, que entretanto se tinha instalado, e o céu fica coberto de nuvens. Começa a chover. Não se levanta. Fica simplesmente ali, com as gotas de água a correrem-lhe pela face.
Já completamente molhada, pensa em levantar-se e fugir dali. Mas porquê? Já tinha ficado tanto tempo à espera, a aguardar pela chave, que não valia a pena desistir naquele momento e ficar a remoer no assunto durante mais uma eternidade. Queria encerrar um capítulo da sua vida. Queria acabar com aquela tristeza que se apoderava dela aos poucos. Não queria voltar a ser devorada pela inveja e pelo ódio que nutria pela vida feliz dos que a rodeavam. Por ser uma rapariga indecisa e cheia de dúvidas, voltou a pensar em desistir. Levanta-se, muito devagar, põe a mala às costas, daquela maneira muito própria, muito desajeitada. Prende o cabelo com aquele elástico preto que anda (quase) sempre no seu pulso, já muito velho e "vivido".
Estava prestes a baixar os braços e a dar os primeiros passos quando, lá no fundo, ouve uma voz. Alguém grita o seu nome. Esse alguém vinha a correr desenfreadamente, ofegante, e ainda mais encharcado e molhado que ela. Vinha de mala às costas e com um pequeno objecto escondido entre os dedos da mão direita.
Mal chega perto dela, agarra-lhe na mão e sussura-lhe algo ao ouvido, que a deixa petrificada. O seu coração bate cada vez com mais força e começa a tremer. Fica sem força nas pernas. Estava a começar a cair, quando ele a puxa para junto de si e a abraça. Ficam abraçados durante algum tempo. Ela chora. Ao vê la a chorar, ele abre a sua mão direita e mostra-lhe o que tinha guardado há tanto tempo. A chave. Continua a chorar, de felicidade claro. Era a chave do seu coração. A chave que há tanto tempo procurava.

Joana

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